Compilação de textos escritos (de I a XI)
- Irina Marques
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Havia muito tempo que já não frequentava aquele espaço, local que em tempos passados considerava o meu espaço, único para mim. Não me lembro bem do exterior mas o interior tenho gravado na mente. As peças do mobiliário, as cores que o compunham e a grande vidraça que apanhava toda uma parede que iluminava o local, maioritariamente escuro.
Entrei, subi as escadas. Lembro-me de pôr a mão no corrimão de madeira, senti o pó que se tinha acumulado ao longo dos anos. Ao caminhar, aquele sexto degrau, ainda rangia, como sempre rangeu. Tentei apenas pisar a carpete cor de vinho que levava até à bifurcação da escadaria, segui para a direita e subi o novo lanço de escadas. Teve sempre pouca iluminação, e assim continuava, apenas lâmpadas pontuavam as paredes que iluminavam o percurso, candelabros que imitavam velas embora feitos em vidro. Lembrei-me de quando lá ia, por vezes, não acendia as luzes para não incomodar ou outros, usava uma vela com suporte de bronze antigo.
Cheguei ao primeiro piso e fiquei de frente para a porta, ela não destoava da sua envolvência e encontrava-se, conforme me lembro de a ter deixado, fechada. Procurei nos meus bolsos pela chave, agarrei-a com força e fiquei a senti-la no meu bolso, era uma chave de ferro que contrastava com a minha temperatura corporal, estava fria. Depois de a aquecer um pouco enchi-me de coragem, coloquei-a na fechadura, dei as três voltas da praxe e ouvi o clique. A porta destrancou-se. Suspirei.
Empurrei-a muito devagar e, o típico barulho das dobradiças enferrujadas logo anunciaram a minha chegada. De frente, a iluminação vinda da grande janela revelou que estava tudo conforme eu tinha deixado, apenas a poeira percorria o ambiente e as partículas movimentam-se, ora para lá ora para cá, à medida que eu avançava. Dançavam no ar, movimentando-se ao sabor da sua própria envolvência. Estava tudo conforme eu tinha deixado, esquecido.
Senti-me bem, eu sempre me senti bem ali. Não se tratava de um ambiente claustrofóbico, as paredes eram feitas em madeira clara que contrastavam com o teto em caixotões também em madeira decorados de forma muito simples e mais escuros. Era um espaço grande, sua altura representava um nível de dois andares, ao qual acedia ao segundo, através de umas pequenas escadas em caracol situadas à esquerda da porta de entrada. Cá de baixo, conseguia-se ver a balaustrada toda em madeira polida, que percorria todo o primeiro andar. E os livros, esses cobriam todas as paredes referentes ao segundo piso, com a exceção da janela, ela cortava o alçado de ambos os pisos. Ainda era possível sentir o cheiro da madeira, tantos anos que passaram mas aquele cheiro não desabitava o espaço.
No nível em que me encontrava, estava tudo igual, a extensa carpete azul marinho escura, cobria maioritariamente o chão em madeira. Lá ao fundo, do lado direito, as telas e o cavalete, do lado esquerdo, o violino e o suporte de partituras conforme o tinha deixado na altura, Canon de Pachelbel encontrava-se à espera de ser ultrapassado. Os sofás de veludo verde opaco por baixo da balaustrada do lado esquerdo da porta, aguardava para voltar à sua cor original e lhe retirasse toda a camada de pó dos anos que passaram.
Horas e horas foram passadas naqueles sofás, ora a ler, a estudar, em discussões com amigos, tempos em que debatíamos questões fundamentais para entendimento da vida, de problemas, perguntas engraçadas e outras não tão engraçadas, soluções estranhas e luzes de ideias. Foi conforto para alegrias mas também para grandes tristezas.
- Porque deixei de parte este espaço? - Perguntei-me.
Está na hora de arregaçar as mangas e limpar o pó. Voltar a mostrar as cores e dar vida à vida que aqui acontecia. Muitos dos estragos feitos pelo tempo já não são possíveis remendar, como as cordas do violino que deixei esquecido lá no canto. Mas os livros, apesar de clássicos, ainda são atuais e, os pincéis e as telas ainda estão em branco. Tentarei voltar a dar vida a este espaço. Pensei.
Olhei à volta e tentei organizar a minha cabeça. Sempre foi muito difícil pegar em algo, e seguir do início até ao fim sem que algo me passasse pela cabeça e me distraísse.
O primeiro pensamento que surgiu:
- Por onde começar? Talvez a limpeza, sim, essa parece-me bem. Não vou conseguir organizar nada sem primeiro haver uma limpeza de pó e do sofá, do chão, e dar um ar mais fresco à casa, mudar as lâmpadas, limpar as madeiras e lustrar.
Para tal, subi as escadas em caracol feitas em ferro, que levavam ao primeiro andar à procura do meu aparelho de som, na esperança que ele ainda funcionasse.
Assim que subi vi-o, no fundo da balaustrada, do lado direito, junto ao estirador onde eu costumava escrever. Dirigi-me até lá. As partículas de pó levantavam-se por todo o lado. Ao chegar, reparei que se encontravam em cima do estirador alguns livros, aqueles últimos que tinha andado a ler. Sempre fui muito meticulosa nas minhas leituras, sempre gostei da parte de investigação, história, arqueologia, entre outros assuntos, a arte sempre me fascinou foi algo que sempre quis seguir.
Ao lado do estirador, encontrava-se o aparelho de som, esperava que ele ainda funcionasse.
Carreguei no botão e ele ligou-se. Fiquei feliz por aquele aparelho tão antigo ainda funcionar. Procurei por uma música calma que me permitisse começar com os meus afazeres. E assim segui.
Não tardou muito e estava tudo arrumado, agora, todo o espaço reluzia. A madeira espelhava com o lustre e a frescura do cheiro da lavanda pairava no ar. Gostava de sentir aquele aroma, proporcionava-me paz e sentimento de dever cumprido.
Peguei nos livros que se encontravam em cima do estirador e levei-os para as suas respetivas estantes, selecionei alguns cadernos. Finalmente tinha o espaço arrumado.
De seguida, fitei o violino, um sentimento de tristeza apoderou-se de mim, as cordas desafinadas e as partituras em aberto, arrumei-o até poder dedicar-lhe a devida atenção.
Sentei-me um pouco no sofá, inevitavelmente as memórias dos bons momentos ali passados começaram a tomar forma na minha cabeça. Peguei num caderno e comecei a tentar situar, datas, conversas e com quem estava.
Fitei a grande janela de onde entrava uma luz muito forte vinda do exterior. Eu queria repousar um pouco e pensar, levantei-me e fechei as cortinas. Sabia que qualquer barulho ou algo que se passasse lá fora iria distrair-me. Voltei-me a sentar com as pernas esticadas sobre o sofá, peguei no meu novo caderno e comecei a escrever. Agora, com tranquilidade, aos poucos a vida aconteceu naquelas folhas.
Este espaço foi sempre onde tinha à mão tudo o que precisava, e nunca precisei de muito, somente o essencial. O restante, bastava-me pegar na caneta/pincel e criar, ou mesmo, qualquer material. Sempre me senti bem só e a criar.
Agora que abria os cadernos e desenhos passados, conseguia navegar nas ondas internas, como observadora distante do que acontecia. Lia e revia algumas memórias e acontecimentos sem me envolver em tristezas. A vida como uma corrente, uma linha cronológica começava a surgir. Era tempo, mais que tempo de resgatar os meus fios e começar a tecer a linha da minha existência. Fio a fio, pauta a pauta, desenho a desenho, fotografia a fotografia, linha a linha comecei a percorrer aquelas páginas e a tirar as minhas notas.
- Tudo começou em Lisboa… cidade onde nasci e me fiz até aos sete anos… depois, bem, depois outras aventuras começaram.
Os meus escritos só começaram a tomar forma quando tinha doze anos, num registo de escrita corrida sem vírgulas, fluida, e como escrevia tanto nesses tempos. Nunca foi algo que gostei de compartilhar, talvez por haver na minha família quem escrevesse melhor, sempre achei que nunca teria jeito (ainda acho). O meu avô era um homem que sabia muito bem colocar e pontuar as palavras e não só, algo que ficou herdado no genes de família, o meu pai sabia o dicionário de trás para a frente - palavras que nem sabia da sua existência, coisa que me deixava desmotivada, acreditava piamente que para se escrever bem deveria conhecer todas as palavras do dicionário. Eu lia, aprendia, mas não aplicava palavras que não fossem entendidas.
As artes musicais, artesanato e o desenho, essa vertente viria do lado materno - família com maestros, fadistas, e pessoas que criavam arte com as mãos, a minha mãe sempre foi dada à decoração e invenção de misturar vários materiais para criar.
O teatro e dança, esse começou muito cedo, foi nesta altura, nesta cidade.
Como é curioso observar estes álbuns que contam tanta história e, ao mesmo tempo, trazem-me uma componente triste, porque sim, a vida em Lisboa era uma vida boa. Mas para a trazer de volta terei que fechar os olhos e refletir de outra forma. Uma visita feita devagarinho.
De olhos fechados comecei a deambular por momentos, estações, fragmentos. Algumas névoas apareciam pela mente e, aos poucos, tudo ganhava forma, e a forma ganhava dimensão era uma imensidão. Tudo partia de um ponto, esse era o mais complicado de perceber. Seria necessário perceber? Continuei a planar…
Não tardou muito até que um barulho me fez desconcentrar. De tal forma, que parecia que me tinham puxado à terra. O barulho acentuou-se, tentei identificar, ainda pensei se o haveria de identificar ou não. Impossível, tinha que o identificar, foram duas vezes que o ouvi, na segunda com maior intensidade. Parei, e foquei no som na tentativa de o identificar - alguém tinha batido à porta.
Por momentos fiquei na dúvida se haveria de abrir ou não, nunca gostei de ser interrompida quando me encontrava a criar, a minha dificuldade em voltar a focar fazia com que sem querer me tornasse um pouco antipática com as pessoas que me desconcentravam.
Pensei, se haveria de abrir a porta, ou não.
- Quem é? - Perguntei eu ainda sentada no sofá.
- Estás mesmo cá? - Respondeu a voz do outro lado da porta.
Pensei se seria uma pergunta retórica, nem respondi, era claro que estava ali. Também me apercebi que a voz era do Gustavo e, de momento não me apetecia muito falar com ele, tinha começado um projeto e não queria ser interrompida. Aprontei-me a responder:
- Olá Gustavo, estou sim. Mas de momento estou ocupada.
- Nem acredito que voltaste! - Disse surpreso.
- Mas agora não posso, ando em arrumações. Mais logo, apareço lá em baixo no salão e falamos um pouco, pode ser?
- Está bem! Fico feliz que tenhas voltado!
Não disse mais nada, continuei a visitar algumas recordações e a escrever no meu bloco, conforme tinha planeado na minha cabeça. Durante muito tempo quis escrever, mas estava constantemente a ser interrompida no meu raciocínio, ninguém poderia escrever por mim, portanto dei continuidade à linha existencial, uma linha muito ténue. Porque se não somos nós próprios a contar a nossa história das nossas vivências e experiências, ninguém o fará.
Era algo que António já me tinha dito e que eu sempre me lembrei - nunca te arrependas do que fizeste, tudo te irá servir de aprendizagem. Seria? Claro que seria. António, era uma das minhas grandes referências, sem dúvida, um membro da família, pessoa que eu transportava no coração para todo o lado que fosse. Algo que trazia sempre comigo, era sangue nas veias.
António, tinha merecido uma medalha de comportamento exemplar em 1924, e a alguma razão se devia. Eu tentava seguir os seus passos mas muitas vezes, certos obstáculos proporcionaram-me outras reações. Sempre houve uma cumplicidade muito grande entre mim e ele, conversávamos muito, eu entendia as suas preocupações. Ele era um homem que se tinha dedicado muito ao trabalho e à construção de um patrimônio para a sua família. Ele colocava sempre a família em primeiro lugar, mesmo com os defeitos que alguns membros pudessem apresentar, conforme dizia:
- Sangue do meu sangue.
Eu tinha herdado esse gene dele, todos diziam que eu tinha o feitio dele. Até que um dia tudo se desmoronou, a minha lenda deixou de existir. Tudo o que foi construído numa vida viu-se levado para fragmentações. Ele era um visionário, sabia exatamente o que iria acontecer no futuro e deixou-me com um papel, um papel fundamental importantíssimo para algo que ele previa ver acontecer.
Infelizmente, eu não tinha a coragem que este homem tinha, muito menos a sua intensa personalidade - era um homem bom, amigo do amigo, dado à família. Faltava-me a idade e o respeito que só ele transmitia. Não consegui dar andamento ao seu pedido, aquela promessa que lhe fiz, foi-me impossível de cumprir.
Hoje custa-me e dói-me admitir, não a cumpri, não por minha vontade mas porque o tempo requer sempre mudanças, e eu não tenho o caracter forte nem a idade que ele tinha. Infelizmente ou felizmente, ele não está aqui para ver o que aconteceu. Ter-lhe-ia partido o coração, assim como partiu o meu.
Peguei no que estava partido e remendei-o, assim, mantive-o no meu coração e através da recordação e memória ficou para sempre comigo, o essencial.
As recordações começaram a tomar posse de mim. Um misto de tristeza e alegria formava-se dentro do meu peito. As lembranças eram boas, sabia que se continuasse a visitar aqueles compartimentos do meu coração iria começar a cair numa profunda tristeza e saudosismo.
Lembrei-me do Gustavo, talvez fosse uma boa altura de ir ter com ele ao salão. Já não o via há muito tempo, gostava de saber o que ele tinha andado a fazer.
Antigamente, eu e o Gustavo éramos muito amigos, compartilhávamos histórias do que gostávamos de fazer e algumas ideias, era um bom amigo. Levantei-me, e estiquei-me um pouco, dirigi-me à porta e sai. O barulho das dobradiças, denunciaram logo que eu estava a sair do meu espaço. Lá em baixo, a voz de Gustavo dizia:
- Quem é vivo, sempre aparece!
Sempre foi muito brincalhão, tinha um tipo de humor que eu apreciava, não era muito evasivo mas, às vezes, usava um tom sarcástico que eu não entendia muito bem e, por vezes, entravamos em conflito, ele sarcástico e eu irónica, quem estava à nossa volta não entendia muito bem o que se passava. Sempre fomos assim.
Desci as escadas, agora, era possível ver bem os degraus que pisava, as luzes estavam todas acesas porque os restantes residentes da casa já estavam todos acordados.
Ao descer a escadaria pensava o que iria dizer ao Gustavo. Estive tanto tempo ausente, tinha acontecido tanta coisa. Eu própria, já não era bem a mesma que ele conheceu em tempos atrás, muita coisa havia mudado. Sentei-me no sofá e olhei para o Gustavo, sabia que ia ter que responder a um questionário, coisa que não gostava de fazer. Ele sorriu e disse:
- Ainda bem que estás cá.
- Não sei quanto tempo vou ficar. - Respondi.
- Tudo bem, mas é bom passares por cá de vez em quando, ao menos para sabermos de ti.
Sempre achei que não fazia muita falta naquele espaço, de todos os residentes, era das mais reservadas e que nunca tinha muito a acrescentar. Enquanto todos falavam muito eu, era a que gostava de ouvir as histórias, poucas vezes interrompia os assuntos.
- Que tens feito? - Perguntou.
- Estive a arrumar o meu espaço.
- Sim, isso eu percebi. A pergunta que te estou a colocar é sobre a tua ausência daqui da nossa casa.
- Às vezes temos que nos ausentar, ir ver o mundo, andar um pouco por aqui e por ali. Conhecer novos locais, variar um pouco, sabes que não gosto de estar sempre a fazer as mesmas coisas nem permanecer muito tempo no mesmo local.
- Sei. Sabes que sentimos saudades da melodia do teu violino aqui pela casa.
- Não acredito! Eu incomodava todos com o barulho que fazia.
- Mas sabíamos que estavas cá e, só o treino é que leva à concretização das coisas. Ao ouvir-te tocar, sabíamos que te estavas a esforçar, lembro-me que querias entrar no conservatório.
Sorri, quando Gonçalo me disse aquilo. Realmente, já não estava com ele há muito tempo, precisamente desde os meus dezanove anos, era quando tinha o sonho de entrar para o conservatório e tocar violino. Mas a vida deu muitas voltas e esse sonho ficou pendente. Acabei por lhe responder:
- Seguir outras vertentes um pouco inesperadas. A vida ás vezes traz-nos estas surpresas.
Gustavo ficou a olhar para mim com um olhar inquisitivo. Eu desviei o olhar para a frente e respondi:
- Lá fora começou a chover.
Tinha-se posto um enorme temporal lá fora, e a chuva começava a bater nas janelas envidraçadas do salão.
- Cá dentro não chove. - Respondeu. - Acabaste por não me dizer sobre essas vertentes inesperadas…
- Eu sei! Foi propositado. - Respondi prontamente.
- Sabes, que se não me disseres não consigo adivinhar.
- E, mesmo que eu te diga, não irias entender. - Esbocei um sorriso. Havia coisas que não queria conversar, talvez as razões de ter feito determinadas escolhas e caminhos na minha vida, fosse uma delas. Talvez, porque Gonçalo falava pouco da sua vida também.
- Tu… - Disse-me Gonçalo um pouco perplexo.
Fiquei um pouco atônita com a resposta que ele me deu, provavelmente ele também teria ficado com a minha. Sentimento era mútuo e ficamos ambos calados. Aos poucos, comecei-me a arrepender de ter descido as escadas e ir ao salão. Provavelmente sentia-me mais confortável dentro do meu espaço, onde ao menos lidava com a minha própria comoção. Já ali, tinha-se criado um ambiente ambíguo, a ansiedade começou a tomar posse de mim, nunca soube muito bem fazer conversa para quebrar silêncios. Gustavo conhecia-me um pouco, e deu esse passo.
- Não vamos falar de águas passadas.
- É melhor. - Respondi um pouco envergonhada. Até porque o passado eu, estava a visitar devagarinho e, observava-o como espectadora em todas as recordações deixadas no meu espaço naquela casa.
- Queres falar sobre o tempo?
Ri-me. Deixei de olhar para a frente e fitei-o. Ele sabia perfeitamente que eu não era de conversar sobre assuntos triviais só por conversar.
- Se quiseres falar sobre as alterações climáticas. - Respondi.
- Como referiste que lá fora estava a chover…
- Foi para fugir ao assunto que abordaste.
- Eu entendi. Mas então se não queres falar de ti…
- Nem tu de ti… - Interrompi.
- Perspicaz. Mas sim, posso-te falar que também andei noutros lugares, não permaneci aqui o tempo todo, não desapareci como tu, quase todos os dias voltava a casa.
- Nem eu esperava outra coisa, eu não desapareci, apenas me ausentei. E, é bom, finalmente, saber de ti Gustavo. - Disse-lhe, após ter falado um pouco dele. Não entendeu muito bem o que quis dizer com aquilo e olhou-me com olhar intrigado. Continuei - Assim, como tu gostavas de me ouvir tocar e, saber que ao menos estava ali, a esforçar-me, eu, também gosto de saber o que andavas a fazer, saber que não ficaste aqui o tempo todo, que andaste a conhecer outros lugares.
Desta vez foi Gonçalo quem sorriu e não sarcasticamente mas sim por felicidade, saber que a amizade era correspondida com sentimento de preocupação.
- Vou voltar lá para cima Gonçalo. Gostei de te ver e saber de ti. - Sabia que as nossas conversas não iriam muito mais longe
Levantei-me e voltei a subir as escadas, fechei a porta à chave e tentei começar a trabalhar, mas fui logo invadida pelas recordações, aquele dia, era um dia muito especial. E sem conseguir expressar de outra forma, peguei numa caneta e papel e escrevi:
Hoje farias 98 anos, minha lenda, mas cá dentro no meu coração e na minha recordação estarás sempre presente. Quem diria, que exatamente há dois anos, irias ter o teu aniversário para, passado seis dias, deixares de cá estar. Ainda me lembro e te tenho no coração todos os dias, ainda me custa a acreditar, ainda hoje não caí em mim. O sentimento de adoração profunda que sentia por ti nunca vai passar, de amizade e carinho, são as lembranças mais importantes que retenho dentro de mim. Estarás sempre no meu coração e na minha memória.
- Para A. M.
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