Criar é um acto solitário. Não há outra forma de explicar esta questão. Sem solidão, tédio não se cria nada de jeito. Isto porquê? Talvez seja os momentos que esteja mais introspetiva e tenha diálogos comigo - soluções aparecem - essas são traduzidas em criação.
O pior que pode acontecer, que é o que me anda acontecer ultimamente é ser avassalada por um turbilhão de ideias e quero por todas em pratica ao mesmo tempo, resultando na não conclusão de diversas obras em simultâneo. Tenho uma grande dificuldade de começar algo e acabar, as coisas ficam sempre a meio. Mesmo as minhas obras "completas" são fruto de um abandono e não de olhar para elas e dizer Ah sim muito bem, está terminada.
O processo criativo é como o atravessar de um rio, nunca sabemos se alcançamos a outra margem, uma constante luta contra a corrente, o ver a outra margem ao longe mas o seu alcance parece nunca chegar - é o saber que quando chegarmos à outra margem temos algo a esperar-nos lá. O quê? Não sabemos.
O processo criativo é como entrar numa floresta, ir em busca do desconhecido, a maravilha de encontrar algo nunca visto antes, o perdermo-nos junto ás árvores - árvores - as quais colocamos perguntas que nunca são respondidas, uma música surge-me na cabeça e acompanha-me neste processo de descoberta.
O processo criativo é solitário é ir em busca do desconhecido e voltar com um sem numero de experiencias que apenas as podemos transformar em arte. É fazer uma viagem e fazeres as capturas de cores de um país, é ires de férias e trazeres a paz de espirito dessa incursão, é fazeres um trilho e as ideias ferverem na tua cabeça. É pegares no pincel sem falares com ninguém, isolares-te, não gostares de ser interrompida e comunicar tudo com a tela.
E não são poucas as vezes que tanto trabalhas num estado feliz e agradada como depressiva e triste, a tela carrega todas as tuas dores. Facto é que sem a solidão não consigo criar. Comparo também a solidão a uma liberdade criativa. Muitas vezes sinto-me só mesmo que acompanhada porque foco-me demasiado no trabalho - eu gosto de criar eu gosto do meu trabalho - sinto-me realizada e dá-me prazer.
Reformulando a parte de sinto-me só mesmo que acompanhada tem a ver com os períodos criativos, por mais que entre alguém no mesmo espaço em que eu estou, por mais que falem comigo nesses períodos de elaboração dos trabalhos a solidão e isolação predominam. Por outro lado quando o processo criativo acaba, tenho companhia.
Mas não sou uma pessoa de grandes companhias, consigo contar pelos dedos de uma mão as pessoas a que chamo de amigos, e embora possa parecer uma pessoa sociável, que sei que o sou, o excesso de social cansa-me. Não sei fazer conversas de acaso e distraio-me facilmente dos assuntos porque o meu cérebro navega.
E com estas navegações entro novamente na solidão. O que são estas navegações? São as percas de noção de tempo. É um véu que se mascara em mim e me faz sentir completamente só e fico quieta mas com o mais pequeno toque sinto-me a regressar. É como se entrasse na minha cabeça profundamente e esperasse que ela me aconselhasse a deixar de perder este tempo. Estou lá mas não estou - e nunca sei quanto tempo lá estive. Há pessoas que desligam eu navego. Pensamentos encadeados uns nos outros, atropelam-se, recortam-se, fundem-se - deixo passar tempos e tempos - Navego. Ás vezes perco a noção de quanto tempo perdi desde que respondi a alguma questão.
Estes pensamentos muitas vezes prendem-se ao sentir que todos se vão embora, vendo a realidade sabemos que todos vamos embora, vi alguém perder um familiar e penso que todos nós vamos embora, agarro-me profundamente a ti porque sei que qualquer dia vamos embora. Terei tempo para fazer tudo o que quero? A finitude do tempo, pelo menos do meu.
Outras vezes prendem-se a histórias de histórias de histórias de histórias, fantasias, criações fantásticas, que provavelmente alguém já criou porque não inventas a roda, trabalhas sobre ela. Crias história na tua cabeça e agarraste profundamente a ela.
E ainda outros assuntos os mais variados em que associas e associas e no final tens um esgotamento cerebral porque te encontraste demasiado tempo a navegar.
Quantas vezes me encontro esgotada por ser mentalmente demasiado activa, e grande parte das vezes são estas solidões que me assolam. Se é algo bom ou mau? Eu encaro como o processo criativo. Não e um processo limpo, é mesmo confuso e difícil de explicar.
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