Desde à dois meses que ando com esta espécie de bloqueio criativo, não é algo novo para mim, de tempos a tempos sofro deste problema. Aos poucos entendo e aprofundo esta situação, abordo-a com cuidado e aparecem revelações que começam a fazer sentido e aos poucos ganho novamente controle sobre a parte criativa que se encontra abafada nestes períodos.
De tempos a tempos sofro de ligeiras depressões e são elas que, por vezes, contribuem para estes bloqueios. Foi muito devido a este facto que faço pouco uso da internet, incrivelmente a incidência das minhas depressões baixou consideravelmente após fazer um detox. Mas tenho depressões que dependem muito da estação em que nos encontramos, o Inverno para mim é um suplicio. Volto-me tanto para dentro de me mim que conseguir-me resgatar é um cabo dos trabalhos, especialmente porque fico aconchegada e confortável no meu desconforto emocional, e com isto não quer dizer que não produza, já tive trabalhos que me surgiram quando estava bem lá no fundo do poço. E até confesso, que quando estou feliz e alegre da vida, os meus trabalhos saem-me pouco genuínos. Talvez aquela emoção que procuramos a todo o custo, a felicidade, não seja a melhor para a veia criativa tomar as rédeas.
Conforme referi, à dois meses que me encontro bloqueada, ideias não surgem para as continuar. Elas surgir, surgem, mas são muitas, demasiadas para conseguir agarrar qualquer uma delas e dar-lhe forma.
Então, no inicio desta semana resolvi experimentar algo - contrariar com todas as minhas forças possíveis a minha vontade de "não criar". O sentimento foi um pouco como o de quando sai de uma depressão que estive sujeita à uns anos atrás. Lembrei-me das quatro premissas a que me agarrei e peguei numa tela. Uma coisa era certa, não queria continuar a fazer o estilo dos últimos trabalhos que tenho estado a elaborar. Curioso que o outro dia disseram-me "adoro o estilo das tuas ultimas pinturas, estou sempre à espera da próxima, são tão bonitas! Estás a fazer uma bela colecção com elas.", e pronto, estragaram tudo... Agradeci os cumprimentos e elogios mas internamente o que se passa é algo bem diferente, estou a ficar cansada desta abordagem que estou a ter. Com isto não quer dizer que não as continue a criar, porque vou, mas estou a necessitar cor, das minhas abstrações de me refugiar na imaginação e soltar, estou a ficar agarrada a um estilo e não quero estar. Dizer que o trabalho é bom, foi exelente, mas por vezes a expectativa da pessoa e algo que não irei continuar a corresponder porque tenho estas contradições dentro de mim a fervilharem.
Peguei então numa tela e expandi, transbordei, soltei e não demorou muito até ideias começarem a surgir e novas ideias se encadearem, e outras e outras, etc... Digamos que converso muito com os meus pinceis e com a minha tela e o que dali saiu foi algo muito diferente do que faço ou talvez uma remistura de algo que já fiz e combinei de forma diferente - dei um novo olhar. Custou-me imenso olhar para a tela em branco e o diálogo não aparecer, mas assim que ouve a primeira palavra, o resto fluiu da forma mais espontânea possível e não foi preciso pensar muito. Digamos que sou muito boa a ver coisas onde elas não existem e isso pode ser algo mágnifico para a criação mas um verdadeiro pesadelo para a vida e para o dia a dia. Tenho também a sua oposição, não ver de todo e tudo me passar ao lado, que também se enquadra nos dois tramitos que acabei de referir.
Quando acabei a obra, que foi muito rápida de fazer, pensei - contrariei o meu bloqueio e algo surgiu. Algo totalmente diferente e inesperado, foi uma conversa bem diferente das anteriores, que tive com a minha tela. E não, não saiu os temas mitológicos que tenho vindo a abordar, surgiu sim, um novo tipo de comunicação inquietante - estas que se referem aos nossos bloqueios e como os ultrapassar, ou pelo menos tentar "enganar" o cérebro e faze-lo cooperar connosco. Eu sabia que a partir do momento que fosse pegar num pincel e numa paleta colorida novos caminhos se amplificariam ao meu olhar. O tema? Abstração que é onde me encontro, quando me perco.
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