Não faço muito uso da internet e, cada vez mais, uso menos e menos. Para mim a internet serve para determinadas funções e com a sua dosagem em medidas q.b. funcionam. Passo tempos e tempos sem consumir estas dosagens tanto que, por vezes, amigos pensam que desapareço da face da terra. Quer-me parecer que agora para existir é necessário publicar todos os dias, criar informação todos os dias, exibir-se todos os dias, dizer que fez e aconteceu, e esteve e mostrou, bem... nesse aspecto, eu não tenho vida. A sério, sou a pessoa mais aborrecida no planeta sem nada para mostrar, contar e partilhar. E gosto de assim o ser. Rodeio-me dos meus trabalhos, dos meus estudos, das minhas experiências e vivo, mas isso são coisas que não têm interesse nenhum. Onde é que já se viu um artista plástico a falar sobre a vida, sobre o seu trabalho? Importante de tudo é estar-se nas tintas. Heis uma expressão tipicamente portuguesa bastante engraçada que se aplica perfeitamente ao acto de criação de alguém que pinta.
Portanto quando enfrento uma tela em branco, o meu processo é sempre o mesmo, não ter planos e o que vai acontecer naquele período é algo muito engraçado, o mundo desaparece, tudo evapora e só vejo à minha frente aquela superfície. O meu cérebro colabora comigo neste assunto sei perfeitamente que a partir do momento em que o pincel toca na tela a minha veia imaginativa é activada de forma nunca antes vista e estou-me nas tintas para o ocorre ao meu redor durante esse período.
Este processo de desapego de inúmeras coisas vem desta expressão. Quando pinto, sinto que só e apenas sinto falta de pintar e criar, portanto o resto à minha volta dilui-se. Hiperfoco e nada mais importa. Curioso como sou muito desapegada de coisas que as pessoas no dia a dia não são, esqueço tão facilmente de determinados assuntos ou, passam-me completamente ao lado, para alguns é visto como uma capacidade de ignorar coisas às quais muitos ficam presos como uma vantagem, para outros, sou distraída.
Dos vários detoxs que tenho feito nestes últimos anos a internet foi dos primeiros de seguida, a pouca televisão passou a nenhuma televisão. Considero as notícias demasiado tendenciosas nos dias de hoje, já não há imparcialidade e sinceramente e após determinados estudos sobre o cérebro humano e como ele processa informação, creio que penso mas livremente se não estiver agarrada a determinadas formas como se expõe notícias. Com isto não quer dizer que não saiba o que se está a passar no mundo, simplesmente filtro muito aquilo que vejo e que perco tempo. Quando se deixa de perder tempo com determinados assuntos, ganha-se noutros. Curioso que temos esta "estranha" noção que os seguidores seguem o nosso trabalho porque gostam e são nossos "amigos" mas isso é um erro muito grande. Ao fazer o dito detox, poucos sentiram a minha falta. Estive cerca de dois meses ou mais afastada das ditas redes sociais e quando voltei, apenas duas pessoas dos cerca de mais de mil seguidores me perguntaram o que eu andava a fazer ou o que era feito de mim. Eu sempre funcionei assim e tive a minha confirmação - é preferivel ter dois ou três amigos verdadeiros que uma data de seguidores que se evaporarmos nem sequer se preocupam. O mais engraçado é que eu sinto o mesmo ao contrário, é obvio que sigo pessoas, mas nem todas me dizem algo, contudo, alguns amigos meus (e falo amigos porque os tenho ao longo dos anos e ficam) se não aparecerem online sinto a falta deles e entro em contacto com eles. Isto não significa que todos ficam, há períodos e períodos. Já no nosso dia a dia acontece o mesmo, frequentamos determinada instituição ou grupos e formamos amizades, quando deixamos esses locais, porque vezes as amizades diluem-se - normal no ser humano.
Às vezes leio e relembro-me o que estudei em História da Arte, sobre os pintores e suas manias e pancas, e riu-me, porque eu lá tenho as minhas! E são muitas, controversas, entro nas maiores discussões com os meus discursos internos não de forma conflituosa mas sim de forma contraditória. Mas nem todos os pintores eram iguais, muitos gostavam de fama e luzes da ribalta enquanto outros gostavam de estar quietinhos no seu canto a fazer o que gostavam, pintar. Gosto de ler as histórias e ver as criações de cada um deles, denominador comum? Eram todos controversos de uma forma ou de outra. E eu lá tenho os meus preferidos, cada um com os seus. Há períodos que gosto e identifico com determinadas vidas de pintores e suas teorias, outras vezes, não e sinto o oposto.
Neste momento encontro-me numa fase bastante estranha por sinal, mudanças - que se traduzem nas minhas criações como algo que ainda vou desvendar futuramente, por enquanto só quero criar. Com ou sem sentido, com ou sem qualidade, com ou sem nexo, mergulho nas cores e o resto desaparece (facilmente), ainda para mais o meu TDAH ajuda imenso neste respeito. Aos poucos habituo-me e convivo mais facilmente com ele e cada vez que estudo e apercebo-me que determinadas situações fazem sentido um novo horizonte se revela perante mim. Sim, quando era nova e durante muito tempo em que não entendi o que se passava comigo foi problemático e tem dias que ainda é e muito. Mas com o tempo, com a sua aceitação os processos são outros, a comunicação muda e tudo se estende além. Aceitarmos que temos determinada condição é uma ajuda para saber viver com ela.
O detox ao qual me propus veio ao encontro desta condição, o meu cérebro é demasiado ativo e vive com excesso de estimulação por si só. No dia a dia em cinco minutos sou capaz de ter mais de vinte assuntos a passar-me pela cabeça, muitos deles, sem qualquer ligação uns nos outros. O que me fazia a internet? Como curiosa sobre tudo na vida começava a pesquisar sobre algo mas esse algo fazia-me questionar o que lia, então abria sobre o outro assunto oposto, mas entretanto aparecia algo curioso no processo e ia atrás dessa informação, ao fim de cinco minutos, tinha vinte tabs abertos e no fim relacionava tudo. Isto é bem o que se passa na minha comunicação inquietante, ligo assuntos que fazem sentido na minha cabeça mas a qualquer outra pessoa não vê relação, quando explico, passa a fazer sentido a quem ouve. Mas estas explicações só fazem sentido presencialmente, aqui nesta vasta internet sou mais um texto qualquer escrito num sítio qualquer. É o fenômeno da falta de sentimento, da indiferença e da ideia que já se "viu" tudo, pouco surpreende. Mas ainda há o pouco. A verdade é que cada vez mais, estou-me nas tintas para o que se passa ou deixa de passar na internet. As melhores conversas que tenho têm sido as presenciais, tenho encontrado pessoas fabulosas, especialmente nas exposições.
E agora perguntam-me, se assim é, porque usas e porque escreves? Sinceramente, é mais fácil e rápido pegar num teclado e escrever nos meus diários de bordo (que existem desde os meus 12 anos) do que escrever à mão. Quem ler leu, quem não ler... é a internet. E tenho continuado a guardar todos os meus textinhos que escrevi aqui, neste vasto universo, já deram uns valentes arquivos.
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